Em Conjuntura Internacional, Destaques

Pequim está ajustando suas políticas, desajeitada e tentativamente (…) Após as tentativas inúteis de domar o mercado de ações, o governo chinês cedeu às forças do mercado. O resultado foi uma frenagem assustadora da atividade.” Assim foi como David Pilling, editor para a Ásia do Financial Times, sintetizou (27.08.15) o ocorrido na China em julho-agosto/2015. Para bem compreender a citação, traga-se à memória a Terceira Reunião Plenária do atual Comitê Central do PCC, realizada em novembro de 2013 (cf. a coluna de 27.03.14), na qual o governo da Quinta Geração adotou 60 diretrizes com vistas a superar o tríplice dilema que hoje se põe para a China: (a) seguir como economia essencialmente exportadora ou consolidar um desenvolvimento apoiado na expansão do mercado interno; (b) melhorar o equilíbrio entre planejamento central e economia aberta ao mercado; (c) transitar de país ainda fortemente rural para sociedade urbana e modernizada. O roteiro econômico saído da Terceira Plenária de 2013 defendeu um “papel decisivo” para o mercado e um “papel dominante” para o Estado. Oscilações como as sob referência expressaram, em última análise, as dificuldades encontradas pelos dois dirigentes máximos, do PCC e do Estado, ao tentarem equacionar aqueles dilemas. Tradicionalmente, o Primeiro Ministro é o grande responsável pelo estado da economia nacional, mas o líder da Quinta Geração não se tem tolhido a interferir nesta seara. Um inusitado editorial do órgão do PCC, em fins de agosto/2015, descreveu as perturbações recentes como reação, “difícil de conceber”, da parte de velhos líderes às rigorosas campanhas de Xi Jinping, contra a corrupção por exemplo.

Após dois anos de expectativas otimistas com a ação dos líderes, as bolsas de Xangai entraram em queda, num crescendo que levou ao drama da segunda-feira 24 de agosto, rotulada pelos próprios chineses como “Black Monday”. A bolsa de Xangai teve sua maior queda desde 2007, com repercussões globais. As moedas dos países emergentes se desvalorizaram. Os preços das commodities caíram a níveis desconhecidos desde 1999. Mesmo mercados ocidentais como o alemão foram contagiados. Mas, conforme frisou The Economist (29.08.15), os observadores da China excederam-se no seu pessimismo. A China não entrara em crise. Tenha-se presente que se trata de país de renda média, onde o mercado de ações é muito pequeno, ainda sem grande impacto sobre o resto da economia. É o mercado de imóveis que tem dado sustentação ao sistema bancário. Em reação ao “Black Sunday”, os dirigentes ocuparam-se, sobretudo, de conter a desvalorização do yuan, com medidas como o corte no compulsório dos bancos e injeções de liquidez. Fatia substancial das reservas de mais de três trilhões em divisas estrangeiras precisou ser sacrificada, mas a desvalorização está sendo contida, sem prejuízo para a política de abertura ao mercado, em aplicação desde 2013.

Em outros setores, o ritmo de expansão seguiu expressivo, permitindo aos otimistas manter a expectativa de um crescimento entre 6% e 7%, em 2015. A Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma (NDRC, na sigla em inglês), o mais alto órgão de planejamento da China, anunciou por exemplo (07.09.15) a aprovação de seis projetos de estradas e pontes, mais três projetos de construção ferroviária. Um destes um trem de alta velocidade, ligando a Província de Henan ao Município Autônomo de Chongqing. Apesar dos ajustes, a China não deixará de ser um importante comprador de matérias primas e alimentos. Particularmente bem recebida foi a flexibilização, em fins de agosto, das regras para investimentos estrangeiros no setor imobiliário.

Tanto Xi Jinping quanto Li Kequian estavam fora da China em junho último, quando surgiram os primeiros sinais das dificuldades de julho/agosto. Numa interessante correspondência enviada de Dalian, China, Mark Magnier do Wall Street Journal (11.09.15) deu conta de como Li, na volta a Pequim, logo reuniu um grupo de autoridades financeiras e econômicas, criticando-as pela passividade diante das perturbações que começavam. Segundo Magnier, Xi e Li evidenciam boa sintonização diante dos problemas atuais da China, mas têm de enfrentar uma velha guarda poderosa, que se beneficia da situação e não quer que empresas estatais sejam divididas, ou os mercados liberalizados. Xi e Li estariam mudando com coragem as regras do jogo e, aparentemente, abrindo novos caminhos para a economia chinesa. Magnier estava na China dando cobertura jornalística ao Forum Econômico Mundial, organizado anualmente pelos chineses na cidade de Dalian. Li acabara de fazer o discurso-chave da sessão de 2015, afirmando para executivos estrangeiros e da China que a economia do país estava em boas mãos: as reformas seguiam em andamento e a recente volatilidade não afetará a trajetória econômica do país.


Imagem: Petar Pismestrovic, Kleine Zeitung, Austria

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