Em Conjuntura Internacional, Destaques

(Entrevista com Marco Aurélio Garcia, assessor especial para relações internacionais da presidência da República para a jornalista Patrícia Campos Mello do jornal Folha de São Paulo)

PCMQual é o significado da normalização das relações entre EUA e Cuba?

MAG – Foi removido o último resquício da Guerra Fria. Foi uma atitude corajosa do presidente americano, Barack Obama, e uma decisão madura e sensata do presidente cubano, Raúl Castro. Isso cria condições para um diálogo fluido entre os Estados Unidos e a América Latina.

É inexorável que a abertura econômica leve à abertura política?

Já está ocorrendo mudança, embora eu não goste da palavra abertura, porque pressupõe que era fechado. A abertura econômica terá influência no tecido social e político inevitavelmente.

A reaproximação ajuda também Brasil e EUA a descongelarem relações?

As relações entre Brasil e EUA são muito boas e sofreram perturbações menores por causa da espionagem. Temos clara a importância dos EUA no mundo e nas Américas. E os EUA também têm essa percepção. Tanto que o vice-presidente dos EUA, Joe Biden, tentou falar com a presidente Dilma para antecipar o anúncio que Obama faria sobre o reatamento com Cuba.

Isso decorre do fato de nós estarmos há alguns anos envolvidos nas conversas entre Cuba e EUA. Fomos procurados em iniciativas como a de troca de prisioneiros.
O presidente Raúl Castro me pediu que transmitisse a ele informações sobre a disposição dos dois países e me disse: “estamos dispostos a negociar de A a Z, não temos restrições”. Isso foi há um ano. Aí eles fizeram as conversas com a mediação do Vaticano, que levaram ao anúncio.

O que muda em relação ao Brasil?

Os países da América Latina, quando discutiam com os EUA, voltavam-se para o tema de Cuba. Mas havia consciência do problema, em parte do departamento de Estado dos EUA, e Thomas Shannon [ex-embaixador no Brasil e atual assessor especial de John Kerry] teve papel importantíssimo, por seu pensamento lúcido e pela necessidade de reconhecer que um passo tinha de ser dado.

O investimento do Brasil em Cuba, principalmente no porto de Mariel, foi alvo de muitas críticas…

As críticas aos investimentos brasileiros em Cuba são ideológicas. Estamos operando com critérios realistas. Mariel é um empréstimo e será pago com juros. Quando o ex-chanceler Celso Amorim afirmou que os brasileiros querem ser os primeiros amigos de Cuba, não era apenas retórica.

Nós tínhamos confiança no processo econômico e político importante que já estava em curso em Cuba, e nós apostamos nisso.

 

Entrevista telefônica conduzida pela correspondente da FSP em Havana, Patrícia Campos Mello.


Créditos de imagem: asboasnovas.com

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