Em Conjuntura Internacional, Destaques

Contrariando julgamentos, Donald Trump assumiu (20/01/2017) a Presidência dos EUA. Com um discurso de posse agressivo, no qual reafirmou de modo geral as posições populistas, nacionalistas e isolacionistas da campanha eleitoral. Foram 16 minutos de bravatas, sem que Trump tenha invocado o Partido Republicano ou o Congresso para conduzir as reformas que seguia prometendo. Insistiu em que fará isso pessoalmente: “Lutarei por vocês com todas as minhas forças e nunca os decepcionarei.” Logo no primeiro dia de trabalho excluiu os EUA da Parceria TransPacífica (PTP), o acordo de livre comercio que Barack Obama negociara durante oito anos com 15 países da Ásia Pacífico, e prosseguiu com a efetivação de várias das suas promessas de campanha, inclusive a autorização para a construção do muro na fronteira com o México. Trump tem recorrido para isso à emissão de ordens executivas, equivalentes ao decreto presidencial brasileiro, ou seja, sem ter de submeter sua decisão ao Congresso. Ao decretar a saída dos EUA da PTP, Trump pôs por terra inclusive o objetivo de Obama de acuar a China, que não fazia parte do bloco, a perfilar-se pelas regras políticas e econômicas do Ocidente. Sem os EUA, os outros sócios da PTP estão tendendo a transferir seu apoio para a RCEP (sigla inglesa de Parceria Regional Econômica Ampla), um acordo de livre comércio de iniciativa dos países do Sudeste Asiático, cooptado pela China, e que vem caminhando sem a participação dos EUA.
Trump não vê limites para o seu delírio personalista. Ameaça sair de tratados sobre os direitos humanos e põe em causa o financiamento da própria ONU, altamente dependente das contribuições dos EUA. A nova Representante dos EUA na ONU, Nikki Haley, assumiu o cargo frisando que Washington está disposta a mostrar sua força: “Tudo o que funciona, vamos melhorar; o que não funciona vamos tentar consertar, e se qualquer coisa parecer obsoleta ou desnecessária, vamos acabar com ela.”
Ainda mais preocupante é a abordagem dos trumpistas em relação à China. Pequim reivindica mais de 80% do Mar do Sul da China como prolongamento do seu território continental. Nos últimos anos aterrou espaços do mar no interior de grupos de rochedos e recifes, e entre esses grupos, criando ilhas aptas a abrigar infraestruturas, inclusive campos de pouso. Rex Tillerson, ex-CEO da Exxon-Mobil nomeado Secretário de Estado do Governo Trump, contestou com vigor a ação chinesa, ao declarar na sua audiência de confirmação perante o Senado: “Teremos de enviar um claro sinal à China de que, primeiro, tem de parar de construir novas ilhas e que, segundo, seu acesso a essas ilhas também não será permitido.” Tillerson não explicou como os EUA poderão incrementar sua ação contra a China no Mar do Sul, para além das operações já quase regulares da Marinha americana fazendo rondas para reafirmar a liberdade de navegação na área. Essas operações não têm intimidado os chineses, e as declarações de agora foram recebidas sem alarme, com comentários de altos funcionários reafirmando o direito da China de agir livremente no “seu território”. Mas há, sem dúvida, risco de guerra comercial e de um inesperado incidente que desande em choque armado. Possibilidade desse tipo será os EUA rejeitarem formalmente a política de “uma só China”. Quanto às confrontações no terreno do livre comércio, cabe assinalar que os EUA estão sem representação na Organização Mundial do Comércio (OMC), e a previsão é que o Representante de Trump só estará ativo em meados do ano. A China, enquanto isso, expande sua autoridade no quadro da OMC, apresentando propostas e promovendo reuniões de maneira a definir a agenda do ano de 2017.
Vou agora virar a página para um rápido exame das posições de Xi Jinping. Presidente da República Popular da China (RPC); Secretário Geral do Partido Comunista da China (PCC); e Presidente da Comissão Militar Central (órgão supremo das Forças Armadas chinesas); à frente da segunda maior economia do planeta, Xi Jinping é o único governante de peso mundial que pode ser contrastado com Donald Trump. Como este, Xi é um ardoroso nacionalista, preocupado em manter seu país em posição de liderança, mas ele rejeita o protecionismo econômico e o isolacionismo pregados por Trump. Agora em janeiro de 2017, Xi teve ampla oportunidade para expressar seu pensamento nessas matérias. No dia 17, discursando em Davos como o primeiro Presidente chinês a participar dessa reunião anual do empresariado mundial, Xi provocou aplausos delirantes ao apresentar-se como um poderoso líder comunista defendendo a globalização econômica e a abertura dos mercados. “Ninguém sairá vencedor de uma guerra comercial” – frisou. E no dia seguinte, sempre em Davos, Xi Jinping manteve uma longa conversa com o ainda Vice-Presidente dos EUA, Joe Biden, dando realce à sua visão, em desacordo com as ameaças de Trump, do relacionamento bilateral China-EUA: “Os interesses básicos dos povos de ambos os países e do mundo precisam que a China e os EUA trabalhem duro para formar um longo, estável e cooperativo relacionamento.” Horas depois do encontro com Biden, no dia 18, Xi Jinping chegou a Nova York para o discurso na ONU: “A era da hegemonia por parte de um só país acabou” – acentuou Xi, que continuou: “O único caminho para a comunidade internacional é de cooperação e de defesa das regras multilaterais.” Xi estendeu-se, depois, pela necessidade de todos os países terem suas posições levadas em conta, na ONU; alertou a comunidade internacional para que não se deixe ser desfeito o Acordo Climático de Paris; e propôs um novo acordo internacional tendo como alvo acabar com as armas nucleares.

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