Em Conjuntura Internacional, Destaques

Na coluna anterior, falei da busca pelo posto de primeira economia mundial, em que teoricamente se empenham EUA e China. É uma busca a ser vista de vários ângulos. Em termos de volume, é quase consensual que a economia chinesa, graças à colossal população do país, passará a americana na altura de 2028. Mas país ainda em desenvolvimento, com renda per capita em torno de 7,5 mil dólares, a China longe estará de suplantar o poderio dos EUA, cuja renda per capita supera 53 mil dólares (dados do Banco Mundial, atualizados em 30/03/16).

Distância essa que, no entanto, os EUA parecem empenhados em eles próprios diminuir. Jeffrey Frankel, da Harvard, circulou em meados de abril (cf. Valor Econômico, S. Paulo, 16.04.16) um contundente artigo com a conclusão: “Ainda não está claro se os EUA vão continuar a liderar o mundo. O que está claro é que a política americana, e não acontecimentos mundiais, serão o principal determinante”. No artigo em questão, o Professor Frankel acompanhara a realização em Washington (15-17 de abril) da sessão anual de primavera do Fundo Monetário Internacional (FMI), desta vez ocupada em referendar a atualização das cotas a serem pagas pelos países membros e do poder de voto desses países, conforme acordo extraído pelo Presidente Barack Obama dos parceiros do G-20, numa cúpula em Seul (Coréia do Sul) em 2010. Foi só em dezembro de 2015 que Obama conseguiu vencer a resistência do Congresso americano a tal acordo. “Um ano a mais sem ratificar a reforma das cotas de participação no FMI” – comentou Frankel – “e os EUA teriam entregado à China as chaves da liderança econômica mundial.” A resistência dos congressistas a ratificar a reforma das cotas visava negar à China o direito de participar da mesa da governança mundial, mas na verdade essa intransigência estava minando a posição dos EUA na sua competição com a China pelo poder e a influência mundiais. Haja vista a corrida de aliados dos EUA, com o Reino Unido na frente e em desacato a barreiras levantadas pelos americanos, por um lugar no Banco Asiático de Investimentos em Infraestrutura, criado pelos chineses.

Neste ano de 2016, a China está presidindo o G-20, tendo liderado uma reunião de Ministros de Finanças do grupo, realizada durante a sessão do FMI em Washington, em meados de abril. Lou Juwei, o poderoso Ministro de Finanças da China, aproveitou o ensejo para uma entrevista ao Wall Street Journal, na qual ele deu eco à posição crítica de Jeffrey Frankel. Lou concitou os americanos a reconhecerem a mútua dependência econômica de EUA e China, e a ampliarem seus investimentos públicos e privados para dar impulso á contribuição dos EUA ao crescimento da economia mundial. A China – argumentou Lou – “já fez a sua parte, durante a crise financeira do final da primeira década do século XXI, com seu grande programa de estímulos, que ajudou a sustentar o crescimento mundial. Cabe agora aos EUA fazerem mais pela recuperação mundial, em vez de desgastarem sua liderança com sugestões como as surgidas no quadro da campanha presidencial.” E martelou Lou: Ao insistirem em enquadrar a China, em violação das regras da Organização Mundial do Comércio, “os EUA estão perdendo o direito a exercer a posição de principal potência mundial.”

A campanha presidencial é, neste momento, a grande incerteza quanto ao futuro dos EUA. A 28 de abril, o Estado de S. Paulo reproduziu um pronunciamento de Donald Trump, o controvertido magnata que já está quase confirmado como o candidato republicano, no qual ele resume suas propostas para o relacionamento dos EUA com seus antigos aliados: “A América em primeiro lugar. Nós não vamos mais entregar este país e seu povo ao falso canto do globalismo. Os países que nós estamos defendendo têm de pagar pelo custo da sua defesa. Se não, os EUA devem estar preparados para deixar que esses países se defendam.” Um dos maiores triunfos de Barack Obama está sendo ameaçado de morte na campanha eleitoral. Trata-se da Parceria TransPacífica (PTP), proposta por Obama como o complemento econômico do seu “pivô” (rebalanceamento estratégico) para a Ásia Pacífico. Depois de muito esforço, ele conseguiu em junho de 2015 que lhe fosse reconhecida pelo Congresso a Autoridade de Promoção Comercial (ordenamento que permite ao Presidente negociar acordos no exterior, em relação aos quais o Congresso só poderá dizer sim ou não). Munido dessa garantia, Obama pôde obter dos doze países da orla do Pacífico interessados na PTP, que afinal assinassem o pacto, em começos de outubro. O evento provocou uma onda de pronunciamentos positivos, inclusive do Presidente, quanto ao peso da PTP na sustentação dos valores e objetivos estratégicos dos EUA, em particular diante da China. Numa reunião em Manila (Filipinas), em novembro, Obama reiterou todos esses propósitos, que no entanto vêm recebendo contestação na campanha eleitoral, inclusive da parte da virtual candidata democrata. Donald Trump tem chamado a PTP de “horrível” e “insana”.

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