Em Conjuntura Internacional, Destaques

Na coluna anterior chamei a atenção para o trabalho pertinaz da Presidente da Argentina, em busca de uma relação privilegiada do seu país com a China. Em julho de 2014, após visita de Estado ao Brasil, o Presidente Xi Jinping foi convidado a ir a Buenos Aires, onde recebeu tratamento e finalizou atos vistos como o lançamento de uma aproximação estratégica Argentina-China. Assim foi que, nos dois últimos dias do ano, o Parlamento argentino aprovou, sem debates, o texto de um Convênio Complementar de Cooperação em Infraestrutura, a ser assinado com os chineses. Os partidos de oposição protestaram, pondo em relevo dispositivos como o do artigo 2, que permitirá ao governo durante cinco anos fechar acordos comerciais e de investimentos com a China, sem passar novamente pelo Parlamento; do artigo 5, que permitirá a encomenda de obras de infraestrutura a firmas chinesas, sem necessidade de licitação; do artigo 6, que descreve facilidades “trabalhistas e profissionais” a serem concedidas a operários chineses trazidos para trabalhar nos projetos, segundo modelo praticado na Nigéria e Angola.

A aprovação desse texto foi medida preparatória da visita de três dias a Pequim que Cristina estava planejando para começos de fevereiro de 2015. Em última análise, para buscar apoio financeiro junto aos chineses, mas sem repetir o gesto dos Presidentes da Venezuela e Equador, que se infiltraram como suplicantes no Foro China-CELAC do mês de janeiro. A Presidente argentina organizou um voo solo, cercando-se de dez dos mais importantes membros do seu governo e fazendo-se acompanhar de um grupo de cem empresários. O Ministro Julio De Vido, da Economia e do Planejamento, viajou com uma semana de antecipação, a fim de obter a liberação do dinheiro para duas hidrelétricas na província de Santa Cruz, feudo eleitoral dos Kirchners. O acordo para o início dessas obras foi o ato central da visita de Cristina, que também iniciou conversações para a construção de duas novas usinas nucleares; uma nova termelétrica ao norte de Buenos Aires; e a instalação de base de observação espacial em Neuquén, no Sul do país. Foram ainda assinados 22 acordos com a China, sobre temas que vão da facilitação de vistos para turistas até a pesquisa geológica.

Um grupo de oito ex-ministros da energia, tanto do partido peronista quanto de partidos rivais, publicou em Buenos Aires comunicado criticando os acordos feitos por Cristina no setor energético sem estudos de viabilidade econômica, e insistindo na necessidade de um debate transparente com atores de diversas correntes políticas. No Brasil, empresários como Klaus Curt Müller, da Abimaq; Carlos Eduardo Abijaodi, da CNI; Thomaz Zanotto, da FIESP; e José Augusto de Castro, da AEB, expressaram na mídia o alarme da indústria brasileira com essas iniciativas da Presidente argentina, as quais ampliarão a perda para os chineses de mercados do Brasil na Argentina. Dados da CNI mostram uma redução de 11% nas importações totais da Argentina, de janeiro a novembro de 2014 relativamente a 2013, sendo de 25% a queda na entrada de produtos brasileiros. O caso mais grave é o do setor de máquinas e equipamentos: as compras argentinas no Brasil caíram 34%, enquanto aumentavam em 14% as feitas na China. Para os críticos, houve falha estratégica do lado brasileiro, o que está permitindo à Argentina tirar do Brasil a posição de porta de entrada da China na América do Sul.

De todo modo, e conforme acentua Mac Margolis, da Bloomberg View, está nascendo um novo eixo Leste-Sul de desenvolvimento, com a China no volante. Uma pesquisa da Universidade americana de Vanderbilt ouviu, em 2013, 41 mil pessoas em 26 países. Os latino-americanos manifestaram simpatia para com a ascensão da China, sendo que 68% dos que assim se pronunciaram julgaram positivo ou muito positivo o papel chinês no hemisfério ocidental, seis pontos porcentuais à frente dos americanos.


Crédito de imagem: editorialperfil.com.ar

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