Em Conjuntura Internacional, Destaques

O Tratado sobre o Espaço Exterior, negociado em 1967 entre os EUA e a URSS, únicas potências capazes na época de conduzir operações militares no espaço, perdeu muito valor desde sua assinatura. Contam-se hoje onze países com tal capacidade e mais de 60 países que possuem ou manejam 1.100 satélites, com funções fundamentais para um sem número de atividades da vida quotidiana. A situação institucional não evoluiu; a URSS saiu de cena; e o espaço permanece, nas suas dimensões militar e de segurança, amplamente desregulamentado. No entrementes, porém, ocorreu uma grande modificação geopolítica, e foi a China que reagiu à Política Nacional para o Espaço, promulgada em 2006 pelo governo de George W. Bush. Pequim mostrava-se há muito convicta de que os EUA buscavam perpetuar suas vantagens na utilização do espaço, como parte de um esforço por obter segurança absoluta às expensas de outros países. A inclusão da China, em posição de adversário, nos jogos militares com dimensão espacial regularmente encenados pelo Pentágono só aumentava a sensação dos chineses de serem alvos de uma estratégica de cerco, da parte dos EUA. Para responder a esse claro desejo dos americanos de reduzir a amplitude chinesa de manobra na área do Pacífico Norte, Pequim começou a expandir e modernizar seu arsenal, buscando sobretudo adquirir a capacidade inequívoca de revidar a um primeiro ataque nuclear.

Nigel Inkster, analista do serviço de inteligência britânico, fornece em artigo na Survival (Out./Nov. 2015) interessantes observações sobre esse trabalho chinês em busca de um equilíbrio, por força assimétrico, com o poderio levantado pelos EUA nas suas costas. Terreno em que os chineses vêm pesquisando com afinco é o das tecnologias voltadas para a destruição ou desmantelamento de material espacial americano, indo até feixes de partículas, micro-ondas, minas espaciais e lasers. Em janeiro de 2007, a China surpreendeu o mundo com a destruição, com um míssil balístico, de satélite artificial americano já fora de uso. Três anos mais tarde, um míssil foi abatido em plena órbita. “O programa espacial chinês” – comenta Nigel Inkster – “tem uma dinâmica em boa medida independente dos propósitos americanos, visando inclusive à edificação em Beidou de um sistema em competição com o GPS dos EUA. A China vê também a pesquisa espacial como atividade crítica na obtenção de descobertas científicas e de engenharia com impacto no desenvolvimento econômico.” (PP 12-13). Em dezembro de 2011, a China deu a público um documento estratégico oficial, contendo ambicioso plano quinquenal de avanços na sua capacitação espacial. O plano previa “o lançamento de laboratórios espaciais, espaçonaves dirigidas e naves para o transporte de cargas; descobertas radicais nas tecnologias-chaves para a construção e manejo de estações espaciais; também nas condições de vida na estação e na recuperação dos astronautas após a permanência no espaço”.

Não tem sido fácil para a China, ainda nas primeiras etapas do trabalho no espaço exterior, desligar as aplicações militares das civis. Isso tem contribuído para a passagem, nos EUA, de legislação proibindo a NASA de colaborar com organismos chineses; colaboração que, no entanto, não deixa de ocorrer. Foi notória a presença de Charles Bolden, o chefe da NASA, no Congresso Internacional Astronauta, convocado pela Federação Astronáutica Internacional para realizar-se em Pequim, em setembro de 2013. Bolden enfrentou as proibições da NASA, precisando inclusive obter autorização especial do Congresso para poder falar com os cientistas chineses.

Procurando situar o assunto na perspectiva da nova plataforma do relacionamento sino-americano, cabe dar relevo à importância adquirida pela pesquisa científica nos dois países. Em janeiro de 2007, os EUA divulgaram planos para superar o abandono da pesquisa científica em favor de voos comerciais, característico da política espacial delineada por George W. Bush em 2004. Nos novos planos propunha-se a retomada da exploração da Lua e, mais além, a de Marte. Alvos com que estava também trabalhando a China, sendo de notar a escolha nos dois países de 2020 como ano-chave para as realizações previstas. Tanto na China como nos EUA, as excursões à Lua, a Marte, e no caso americano a um asteroide, pretendem avançar em duas questões básicas do conhecimento científico. A análise de elementos químicos essenciais para a origem da vida no universo. E o estudo circunstanciado da existência, atual ou passada, da água no sistema solar.


 

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