Em Conjuntura Internacional, Destaques

Ao iniciar em dezembro de 2013 a publicação do seu bem sucedido blog, o Prof. Rogério de Cerqueira Leite abriu, nele, espaço para coluna de minha responsabilidade, voltada para a marcha do relacionamento entre a China e os EUA. Eram as duas maiores economias do globo em números absolutos, e do bom entendimento entre elas dependia a paz mundial. Desde o início da publicação do blog, venho então procurando registrar e explicar a marcha do relacionamento em questão, e sou levado a chamar a atenção para grande reviravolta que está em vias de ocorrer. Sempre atento aos desdobramentos da ordem mundial, The Economist (17/10/15) distinguiu duas arenas aptas a abrigar as manobras e choques que já começam. O campo de batalha do Oriente Próximo, com o relevo que tomou a Síria. E a vastidão da Ásia Pacífico, com destaque para o Mar do Sul da China. A arena do Oriente Próximo só indiretamente afeta o relacionamento EUA-CHINA, e eu só ocasionalmente posso me ocupar dela, apesar da importância de complicações com terceiras potências, como a Rússia. Sou compelido, por pressões de espaço e tempo, a concentrar-me nas vastidões da Ásia-Pacifico. Com a vantagem de que é nessa arena, precisamente, que mais bem se pode observar a nova plataforma da confrontação EUA-CHINA.

Washington estaria, afinal, começando a consolidar as bases do deslocamento estratégico e econômico do seu poderio mundial, do Oriente Próximo para o Pacífico Norte. O chamado “pivô” para o Leste Asiático em que tem estado empenhado o Presidente Obama, desde o início do seu mandato. Na síntese de The Economist, Obama vai-se liberando das velhas noções de que a exportação dos valores americanos criaria, por si só, um mundo de democracia, livre mercado e respeito aos direitos humanos. Essas expectativas não se confirmaram no Oriente Próximo e Obama está tendo, inclusive, de tergiversar ali com a Rússia, na busca de estabilidade para essa região. Já na Ásia-Pacífico, a Marinha americana retomou em silêncio o patrulhamento de águas proclamadas territoriais pela China, num gesto que não acontecia desde 2012. E Washington fechou, afinal, oito anos de negociações com onze países do Pacífico para a criação da Parceria Trans-Pacífica (PTP), um acordo comercial de enorme alcance, concebido basicamente pela primeira e terceira maiores economias do mundo para constranger a segunda, a China, a perfilar-se pelas regras do jogo mundial escritas pela PTP. A China reage ao desafio militar, montando nos seus mares próximos uma força naval respeitável. Além da flotilha anti-pirataria ativa no Oceano Índico, manobras de longo curso da Marinha do ELP vêm-se tornando tecnicamente exigentes, em pontos distante do Pacífico. Agora em setembro, depois de exercício naval com os russos, um grupo de cinco navios da MELP evoluiu perto das Ilhas Aleutas, no Alasca americano. Numa próxima coluna, examinarei as linhas viva dessa confrontação militar.

No plano diplomático, cabe dar relevo à intensa movimentação internacional do Presidente Xi Jinping, em prol da reivindicação da China à Vice-liderança mundial (cf a respeito minha coluna de 06/10/15). De grande importância foi a visita de Estado realizada à Grã-Bretanha por Xi, entre 20 e 24 de outubro. O Chancellor of the exchequer, George Osborne, aproveitou essa visita para conduzir um verdadeiro “pivô” da Grã-Bretanha para o Pacífico Norte. Xi teve seus quatro dias repletos de visitas a universidades e clubes de futebol, entre Londres e Manchester, além dos jantares de gala e discursos nas duas Casas do Parlamento. Ajustes num vasto leque de assuntos foram assinados, fazendo da Grã-Bretanha o principal interlocutor da China no Ocidente.

Ainda em outubro, Xi efetuou uma surpreendente visita de Estado ao Vietnã, o que lhe deu ensejo para protestar contra a intrusão de belonaves americanas em águas revindicadas pela China. Dias antes da chegada de Xi a Hanoi, um destróier americano havia evoluído nas vizinhanças de uma das ilhas artificiais em edificação pelos chineses, provocando irado protesto de Pequim e cinco exercícios de lançamento de mísseis no Mar do Sul da China. O Vietnã assistiu quieto a esse episódio, diferentemente da reação das Filipinas. Xi Jinping elevou a novo nível sua ofensiva de charme, ao organizar para o dia 7 de novembro um inesperado encontro com o Presidente de Taiwan, Ma Ying-jeou. A primeira vez, desde a fuga de Chiang Kai-shek para a ilha, que os chefes das “duas Chinas” se encontraram oficialmente, e em clima de reunificação. O encontro ocorreu em Cingapura, em torno de um jantar em hotel de luxo. Não houve entrevistas coletivas à imprensa, nem foi assinado comunicado conjunto. Durante o mandato do Presidente Ma, no entanto, já foram concluídos 23 acordos promovendo a maior integração econômica entre os dois lados do Estreito de Taiwan. Encerro aqui esta abertura de um exame mais sólido da nova etapa do relacionamento EUA-CHINA; irei fazendo isso em colunas subsequentes e específicas.


Imagem: defense-update.com

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