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Mais perenes do que qualquer partido ou movimento político, algumas ideias sobre o que move os eleitores se repetem a cada eleição. No entanto, dados e detalhamentos das votações desafiam esse senso comum como mostra o presente artigo.

Mito 1 – Foi o Nordeste que elegeu Dilma: Petista não teve menos de 40% dos votos em nenhuma das 5 regiões do Brasil

É claro que o desempenho de Dilma Rousseff (PT) no Nordeste foi crucial para sua vitória: a petista teve 20 milhões de votos no 2.º turno, equivalente a 72% do total de votos válidos na região. Mas a presidente reeleita obteve um apoio razoável em todas as cinco regiões. O menor porcentual de votos válidos foi no Sul: o apoio de 41% dos eleitores que escolheram um candidato.

A impressão de que o Nordeste sozinho é o grande responsável pela reeleição de Dilma é fortalecida quando se vê o mapa eleitoral dos Estados pintados com a cor de quem teve o maior porcentual de votos ali. Nesse mapa, metade do Brasil aparece pintado de azul, como se esse território tivesse ido em direção totalmente oposta à outra metade, vermelha.

O deputado estadual eleito Coronel Telhada (PSDB-SP) chegou a defender a independência do Sul e do Sudeste por causa disso. Mas, na verdade, dos dez Estados em que Dilma obteve menor votação, apenas três estão nessas regiões: Santa Catarina, São Paulo e Paraná. Todos os outros estão no Norte ou no Centro-Oeste. Visualmente, é possível ver como o apoio a Dilma se espalha pelo Brasil pelo gráfico de relevo abaixo – nenhuma das duas maiores “montanhas” que representam o número absoluto de votos está no Nordeste.

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Mito 2 – Palanque estadual influencia eleitores: Resultados e pesquisas mostram desconexão entre opção para governador e presidente

Pesquisas e resultados eleitorais voltaram a demonstrar que a maioria dos eleitores não faz conexão entre o voto para presidente e o para governador. Apesar da prática tradicional dos presidenciáveis de buscar “palanques fortes” nos Estados – alianças com candidatos a governador –, não há evidências de que isso renda votos.

Apoiado por praticamente toda a cúpula do PMDB fluminense, Aécio Neves (PSDB) buscou popularizar no Rio a chamada “chapa Aezão”, na esperança de que os eleitores de Luiz Fernando Pezão (PMDB) votassem também nele. Os mapas de votação de ambos, porém, mostram que não houve sintonia eleitoral.

Pesquisa Ibope divulgada pouco antes do 2.º turno mostrou que, dos eleitores de Pezão, seis em cada dez pretendiam votar em Dilma Rousseff. Marcelo Crivella, adversário do peemedebista, fez campanha explícita para Dilma – mas isso não impediu que cerca de 40% de seus eleitores manifestassem intenção de votar em Aécio.

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Mito 3 – Pesquisas erram resultado da urna Ibope e Datafolha acertam votação do 2º turno dentro da margem de erro: números exatos importam menos para institutos

Embora alguns insistam que as pesquisas de intenção de voto consistentemente erram o resultado das urnas, não é o que mostram os dados – tanto os das eleições de domingo quanto os históricos. A vitória de Dilma Rousseff (PT) na disputa pela Presidência foi prevista pelo Ibope, que lhe atribuía 53% da preferência do eleitorado. Dilma recebeu 52% dos votos válidos, portanto dentro da margem de erro da pesquisa, de dois pontos porcentuais.

O Datafolha também atribuía favoritismo à petista, embora Dilma estivesse no limite do empate técnico com Aécio Neves (PSDB). Ambos os institutos descreveram, por meio dos números, a campanha do 2.º turno: Aécio começa à frente, carregado pelo embalo do 1.º turno, em que teve votação superior ao esperado. Dilma se recupera na última semana, com uma insuficiente reação de Aécio na véspera do pleito.

Para os institutos de pesquisa, os números exatos importam menos que o movimento descrito pelas curvas de intenção de voto de cada candidato. Sem elas, é impossível analisar qualquer campanha.

Desde 2002, a diferença média da sondagem de véspera do dia da eleição de Ibope e Datafolha para o resultado do 2.º turno é de um ponto porcentual – portanto, dentro da margem de erro. Assim, os institutos acertaram os resultados das eleições em todos os anos, mesmo em 2014, na disputa mais acirrada da história.graf

Mito 4 – Votos nulos são sinal de protesto: queda nas taxas entre 1º e 2º turnos indica alta incidência de erros no manejo da urna eletrônica

Após os protestos que tomaram as ruas das principais cidades do País em junho de 2013, analistas e cientistas políticos previram aumento significativo de votos nulos na eleição deste ano. Isso não ocorreu: foram 4,4% de nulos em 2010 e 4,6% em 2014 – a comparação leva em conta o 2.º turno de cada disputa presidencial.

É claro que muitos indivíduos podem anular o voto como forma de protesto. Mas as estatísticas indicam que parcela significativa dos nulos se deve a erros no momento do voto. Uma evidência disso é a diminuição dos votos anulados entre o 1.º e o 2.º turno das eleições – entre uma e outra etapa, o número de cargos em disputa cai de cinco para apenas um ou dois, o que reduz a complexidade do manejo da urna eletrônica.

Outro indício é o fato de que a taxa de nulos para deputado estadual – o primeiro cargo na ordem de votação – é sempre mais baixa, já que são contadas como voto na  legenda as tentativas equivocadas de digitar os números de presidenciáveis.

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Artigo publicado originalmente em http://bit.ly/1pU41AS

José Roberto de Toledo, Daniel Bramatti, Daniel Trielli, Diego Rabatone, Lucas de Abreu Maia e Rodrigo Burgarelli


Créditos de imagem: plantaobrasil.com.br

 

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