Em Conjuntura Internacional, Destaques

Por Ben Hubbard e Clifford Krauss

Autoridades sauditas sinalizaram que estão preparadas para suportar redução nos lucros 

Com os preços globais do petróleo despencando em um ritmo não visto desde a crise financeira de 2008, a Arábia Saudita está despontando como protagonista, acusada por alguns de deprimir deliberadamente o mercado, visando enfraquecer rivais como o Irã, mas vista por outros como a única esperança de deter a situação. Mesmo assim, outros dizem que o colosso do petróleo está apenas lutando para lidar com sua posição cada vez menor em um setor em que antes dominava.

Por sua vez, as autoridades sauditas sinalizaram que estão preparadas para suportar lucros reduzidos em vez de uma redução da produção visando elevar os preços, como fizeram para seu pesar, no início dos anos 80.

Mas a aceitação de preços mais baixos pelos sauditas provocou controvérsia até mesmo dentro do reino. Nesta semana, o investidor bilionário príncipe Alwaleed bin Talal divulgou uma carta aberta ao ministro do petróleo saudita, Ali al-Naimi, o criticando por dizer que os preços mais baixos do petróleo não eram motivo para alarme.

Na carta, Alwaleed chamou a queda de preço de “uma catástrofe que não se pode deixar de mencionar” e sugeriu que ela poderia prejudicar o orçamento do reino.

Alguns analistas dizem que a Arábia Saudita corre pouco risco ao permitir que os preços do petróleo permaneçam baixos, porque o governo conta com grandes reservas financeiras e baixa dívida, que podem ajudá-la a suportar déficits orçamentários. Mas há aqueles que discordam, como Badr H. Jafar, um alto executivo do petróleo dos Emirados Árabes Unidos, que acha que a Arábia Saudita precisará de preços mais altos para pagar pelo alto nível de gastos sociais.

Ele diz que a estratégia imediata dos sauditas é desencorajar os produtores de alto custo nos Estados Unidos e no Canadá e “servir como um alerta a outros produtores antes da reunião da OPEP do mês que vem, de que todos precisam realizar cortes de produção juntos caso queiram coibir a tendência de baixa”.

Outros dizem que o reino enfrentará preços mais baixos independente do que faça, já que não pode controlar as causas da queda dos preços, que incluem o frenesi de exploração na América do Norte e a queda da demanda na Europa, Japão e em grande parte dos países em desenvolvimento. Logo, faz sentido os sauditas defenderem sua fatia do mercado global, dizem os especialistas em petróleo.

“Trata-se de uma guerra de necessidade econômica”, disse Philip K. Verleger, presidente da PKVerleger, uma empresa de consultoria de energia.

Essa necessidade é principalmente produto de um aumento de 70% na produção americana de petróleo desde 2008, que reduziu pela metade as importações de produtores da OPEP. De repente, o óleo cru saudita e nigeriano que antes fluía livremente para os Estados Unidos está disputando por fatia de mercado na Ásia, onde os compradores estão exigindo preços mais baixos. Para piorar ainda mais, os Estados Unidos podem vir a se tornar grandes exportadores na próxima década e reduzir ainda mais os mercados sauditas.

Gary N. Ross, o presidente-executivo do PIRA Energy Group, uma consultoria com sede em Nova York, disse que a Arábia Saudita parece estar aplicando as lições que aprendeu no início dos anos 80, quando respondeu a uma fartura semelhante no mercado com a redução da produção, para manter o preço elevado. Isso lhe custou uma fatia de mercado valiosa que posteriormente teve dificuldade para recuperar, ele disse.

Desta vez, ele disse, a Arábia Saudita está fazendo o oposto: aceitando os preços mais baixos para manter sua fatia de mercado. E se essa política também prejudica os rivais do reino, ainda melhor.

“É conveniente que isso esteja acontecendo em um momento em que o Irã está ficando mais forte e em que a Rússia, uma grande exportadora de petróleo, tem sido um espinho no pé ao apoiar Assad”, disse Ross, referindo-se ao presidente da Síria, Bashar Assad. “Mas não acho que uma motivação política é necessária aqui.”

A queda nos preços mundiais do petróleo poderiam afetar o crescente esforço da Arábia Saudita de usar seu poderio econômico e credenciais religiosas, como lar dos locais mais sagrados do Islã, para expandir sua influência pelo Oriente Médio.

Ela apoiou recentemente campanhas contra islamitas políticos no Egito e em outros lugares, financiou os rebeldes buscando derrubar Assad e enviou tanques para ajudar a debelar um levante político no Bahrein, liderado pela maioria xiita do reino contra seus governantes sunitas.

A Arábia Saudita também se juntou à coalizão militar liderada pelos Estados Unidos para combater o Estado Islâmico, o grupo jihadista que tomou território no Iraque e na Síria.

Por trás de muitas das dificuldades da Arábia Saudita está sua rivalidade com o Irã, uma potência xiita, por influência no mundo árabe e muçulmano.

Os preços mais baixos do petróleo aumentariam as dificuldades econômicas no Irã, que já está sofrendo com as sanções internacionais, visando persuadi-lo a desistir de seu programa nuclear. Eles também provavelmente prejudicariam a Rússia, que tem sido uma das aliadas estrangeiras mais poderosas de Assad e sua maior defensora na ONU, mas que também está sentindo a dor das sanções econômicas por suas políticas na Ucrânia.

Essas considerações não estão longe das mentes daqueles que tomam as decisões na Arábia Saudita, disse Jean-François Seznec, um economista político da Universidade de Georgetown.

“Mas é realmente o Irã que sofrerá mais, e me pergunto até que ponto os sauditas não estão buscando reduzir os preços para trazer o Irã para a mesa de negociação”, disse Seznec.

Outros, entretanto, disseram que apesar dos preços mais baixos atenderem aos fins políticos da Arábia Saudita, eles não motivam sua política de petróleo.

“Eu não acho que a Arábia Saudita  esteja no ramo de moldar a política global por meio da política do petróleo”, disse Sadad Ibrahim al-Husseini, o ex-vice-presidente executivo da Aramco. “Isso é ficção.”

Publicação em português: VIU Online.

Ben Hubbard e Clifford Krauss |Via The New York Times.


Créditos de imagem: wpmedia.business.financialpost.com

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