Em Conjuntura Internacional, Destaques

Na quinta-feira 3 de setembro de 2015, um portentoso desfile militar tomou as avenidas de Pequim, em celebração dos 70 anos do fim da 2ª Guerra Mundial e da rendição do Japão. Desde agosto vinham aparecendo comentários de imprensa sobre a celebração em preparo. Numa arguta análise, a correspondente da Folha de S. Paulo, Johanna Nublat, deu relevo a que não estava em jogo uma simples efeméride. O governo da Quinta Geração de dirigentes chineses organizava, na verdade, uma festa. Filmes, livros, exposições e denúncias de atrocidades vinham sendo agitados, buscando conscientizar a população chinesa da “vitoriosa resistência das massas chinesas diante da agressão japonesa e da guerra mundial antifascista”. Havia, aí, um claro recado da liderança do PCC para o mundo. A China, que de 193l até Pearl Harbor, lutou praticamente sozinha contra o imperialismo japonês, ao custo de 34 a 35 milhões de mortos, deseja agora passar aos povos a notícia de que já não funciona a narrativa elaborada pelos historiadores ocidentais, que procuraram explicar a Ásia do século XX e a Guerra do Pacífico através do Japão, ocidental honorário.

Por anos a RPC, seguindo conhecido conselho de Deng Xiaoping, manteve atitude modesta em relação às suas conquistas sociais e econômicas. Mas a partir da contribuição positiva da China na superação da crise global de 2008, embora continuando a enfatizar o caráter pacífico do crescimento chinês, a Quinta Geração de Xi Jinping vê cada vez menos razão para tolher o protagonismo da China no cenário internacional. “A liderança do PCC tenta sinalizar aos EUA e a outras nações aliadas na guerra que a China deu uma grande contribuição para derrotar o fascismo e ganhou, assim, um lugar legítimo e de comando no sistema internacional” – escreveu a australiana Amy King, citada por Johanna Nublat. O desfile de 3 de setembro ocorreu poucas semanas após um comentado discurso de Shinzo Abe, no qual o Premiê japonês procurou afastar a necessidade de maiores desculpas pelo comportamento japonês durante a guerra e a ocupação da China. Os comentários da mídia chinesa em torno do desfile primaram em não mostrar animosidade contra o Japão ou os japoneses, insistindo em tratar-se de uma celebração conjunta da paz. De uma vitória sobre o Japão, passa-se em silêncio. O analista americano Robert Manning soube, aliás, aproveitar para frisar lição aprendida pelos chineses, com a animosidade anti-japonesa a que se deixaram levar em 2012, no tocante às ilhas em disputa no Mar do Leste da China. Os investimentos japoneses no mercado financeiro chinês caíram significativamente, na época, e Xi Jinping estaria agora distinguindo dois caminhos – uma competitividade estratégico-política e a competitividade econômica. Fala-se até numa próxima visita de Xi ao Japão.

Xi Jinping extraiu todo o brilho que pôde da celebração de 3 de setembro. Era a primeira vez que a RPC comemorava com desfile militar algum evento da guerra. O costume vinha sendo comemorações de caráter civil, ligadas ao PCC. Agora estava ali o Chefe incontestado de um regime com autoridade sobre o país mais populoso do planeta; segunda maior economia do globo; e potência militar em construção. Reivindicando seu reconhecimento como o vice-líder do mundo. A festa foi sonora e levada adiante sem se deixar inibir pela tempestade financeira que parecia estar sacudindo a China. Houve cálculos de 200 mil soldados desfilando, levando entre eles alguns milhares de soldados estrangeiros, na maioria russos. Numa retribuição ao contingente de soldados chineses que desfilou na Praça Vermelha, em maio de 2015, quando a Rússia fez sua comemoração do fim da 2ª Guerra. Para compor o cenário em Pequim foram convidados 30 chefes de Estado ou de governo, tendo à frente Vladimir Putin. Os líderes ocidentais fizeram praça de não comparecer, mas formou-se um quadro expressivo de apoio no cinturão euroasiático.

Em pronunciamento na oportunidade do desfile, Xi Jinping anunciou cortes nas Forças Armadas do país, que deverão perder trezentos mil soldados até 2017, quando se consolidarão em 2 milhões de homens, ainda a maior força combatente do mundo. “Consagrada”, como explicou Xi Jinping, “a ajudar o Estado chinês na nobre missão de salvaguardar a paz mundial”. Desde o final de 2013, Xi Jinping vem falando na otimização do tamanho e da estrutura das Forças Armadas chinesas. A julgar por comentários que lhe foram atribuídos no jornal do PCC, Xi estaria vendo uma janela de oportunidade para a efetivação dos seus planos, depois que sua campanha de combate à corrupção neutralizou duas altas-patentes que figuraram entre as pessoas mais poderosas da RPC.


Imagem: Trumble

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