Em Destaques, Vida Nacional

Por Paulo Paim/ Vilson Antonio Romero

Chega de mentiras. É preciso passar a limpo a atual discussão sobre reforma da Previdência Social. Primeiramente, a Previdência faz parte de algo maior. Ela integra o sistema de proteção criado na Constituição Cidadã de 1988, chamado de Seguridade Social, que inclui o tripé previdência, saúde e assistência social. 

A Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) divulga anualmente a publicação Análise da Seguridade Social e os superávits são sucessivos, a saber: saldo positivo de R$ 59,9 bilhões em 2006; R$ 72,6 bilhões em 2007; R$ 64,3 bi em 2008; R$ 32,7 bi em 2009; R$ 53,8 bi em 2010; R$ 75,7 bi em 2011; R$ 82,7 bi em 2012; R$ 76,2 bi em 2013; R$ 53,9 bi em 2014. 

No ano passado não foi diferente. O investimento nos programas da Seguridade Social, incluídos aposentadorias urbanas e rurais, benefícios sociais e despesas do Ministério da Saúde, entre outros, foi de R$ 631,1 bilhões, enquanto as receitas da Seguridade foram de R$ 707,1 bi. O resultado, mais uma vez positivo, foi de R$ 24 bilhões – nada de deficit! 

Para agravar o cenário, tramita no Congresso Nacional uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que não apenas prorroga a DRU até o ano de 2023 como amplia de 20% para 30% o percentual que o governo pode retirar dos recursos sociais. Se a medida for aprovada, pode significar a saída de R$ 120 bilhões por ano do caixa da Seguridade. 

Também é preciso enfatizar a importância da Previdência no cotidiano do Brasil. Hoje, são pagos 32,7 milhões de benefícios, incluindo 9,7 milhões de aposentadorias por idade; 7,4 milhões de pensões por morte; 5,4 milhões de aposentadorias por tempo de contribuição; e 3,2 milhões por invalidez, entre outros. O peso desses números é enorme, com impacto social e econômico. 

Hoje, dos 5.566 municípios, em 3.875 (70%) o valor dos repasses aos aposentados e demais beneficiários da Previdência supera o repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Mais ainda, em 4.589, ou 82% do total, os pagamentos aos beneficiários do Instituto Nacional do Seguro Social superam a arrecadação municipal, ou seja, é com o pagamento aos aposentados que a economia e o comércio dessas cidades giram. 

É com esse cenário que, mais uma vez, surgem as propostas de reforma da Previdência, como se o sistema fosse um problema nacional – os números aqui expostos comprovam exatamente o contrário: é a Previdência que garante cidadania e movimenta a economia. 

A defesa da reforma nasce como uma espécie de cortina de fumaça para encobrir os problemas reais. Em vez de buscar soluções para o crescimento econômico, como uma efetiva e verdadeira reforma tributária, a revisão do pacto federativo, o estabelecimento de taxas de juros que estimulem o mercado sem empobrecer a população, o governo interino mira o seguro social. 

Lamentavelmente, prefere atacar a poupança social dos brasileiros e das brasileiras, dinheiro economizado pelos trabalhadores ao longo de toda a vida laboral para, no futuro, gozar da justa e merecida aposentadoria. 

Nos moldes defendidos pelo governo, o sonho da aposentadoria pode virar pesadelo em vida, ou nem isso, porque muitos podem morrer antes de desfrutar um pouquinho sequer dessa conquista. Como falar, por exemplo, em idade mínima, e ainda por cima igual para homens e mulheres, quando vivemos em um país com dimensões continentais, repleto de variadas desigualdades regionais? A título de exemplo, um homem no Pará nasce com a expectativa de vida de 64 anos, enquanto para uma mulher de Santa Catarina esse número ultrapassa os 80 anos. 

Implantada a reforma sugerida pelo governo, a Previdência Social passaria a ser tão somente um programa de renda mínima, pagando benefícios cada vez menores, abaixo inclusive do piso salarial. Isso aconteceria, é bom alertar a todos e a todas, porque o Planalto defende a desvinculação do benefício previdenciário do valor do salário mínimo, ou seja, a aposentadoria poderia ficar menor do que o mínimo e, para piorar, com a absurda tendência de distanciamento cada vez maior entre os dois, já que certamente os governantes proporiam reajustes sempre menores nos benefícios em relação àqueles do salário mínimo. 

É fundamental melhorar a fiscalização sobre o setor, por meio do aumento do número de auditores fiscais em atividade e do aperfeiçoamento da gestão e dos processos de fiscalização. Também está na hora de rever as alíquotas de contribuição para a Previdência Social do setor do agronegócio, que pode e deve contribuir mais para assegurar a aposentadoria do trabalhador do campo. 

É preciso que a sociedade brasileira vista a camisa e assuma a defesa intransigente e a manutenção dos direitos sociais e a gestão transparente da Seguridade Social, além do equilíbrio financeiro e atuarial da Previdência Social pública e solidária. Só assim poderemos manter o seguro social, o verdadeiro patrimônio dos brasileiros e das brasileiras.    (Paulo Paim – Correiro Braziliense)

Correio Brasiliense: 19/07/2016.

Paulo Paim. Senador e presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal. Vilson Antonio Romero. Presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip)


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