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Por Lilian Milena

Há sete anos o ex-ministro da Fazenda e atual professor emérito da Fundação Getúlio Vargas, Luiz Carlos Bresser Pereira, desenvolve uma nova proposta para a economia desenvolvimentista, consolidada em três obras publicadas ao longo desse período: Macroeconomia da Estagnação (2007); Globalização e Competição (2009) e Developmental Macroeconomics (2014).

Durante sua participação no Brasilianas.org (TV Brasil) o economista, declaradamente keynesiano, destacou os principais pontos da sua teoria, apontando a “doença holandesa” como a razão de o Brasil ter parado de crescer desde 1990. Bresser Pereira, inclusive, coloca-se como um dos culpados por isso.

Ele lembrou que participou das discussões para a abertura comercial, entre 1990 e 1991, onde se decidiu acabar com a proteção de 45% dada à indústria nacional. “Estávamos completamente errados, pois cerca de metade dessa porcentagem não era protecionismo e sim neutralizadora da doença holandesa”, afirmou.

A doença holandesa é um termo inspirado nos anos 1960, quando a apreciação dos preços de gás natural aumentou a receita dos Países Baixos, valorizando o moeda local. A apreciação cambial, no entanto, derrubou a exportação dos demais produtos daquelas nações, já que os preços dos bens locais se tornaram menos competitivos no mercado internacional. Esse fenômeno é recorrente em países que tem sua economia baseada na exportação de commodities, como o Brasil.

Como definiu Bresser Pereira, a taxa de câmbio é determinada por aquilo que torna lucrativo a exportação de commodities, e não que torna lucrativa a exportação de manufaturados, prejudicando, assim, o desenvolvimento de uma indústria mais consolidada no país. O professor explicou, ainda, que a taxa de câmbio funciona como um interruptor de luz que, “liga ou desliga as boas empresas” que se tem no país, no mercado externo e também no mercado interno.

O economista destacou que só identificou o problema nos anos 2000. Antes, junto com Yoshiaki Nakano, formulou a teoria da inflação inercial, usada como base no Plano Real, implantado em 1994. “O plano foi bem sucedido, porque foi bem pensado [pelos economistas da PUC-Rio que desenvolveram melhor o programa] e porque os brasileiros não aguentavam mais a inflação”, destacou.

Com a inflação estabilizada, os economistas acreditavam que o Brasil fosse crescer significativamente. Mas o passar dos anos demonstrou que estavam errados. Berrer Pereira acredita que faltou aos governos, desde então, criar mecanismos para neutralizar a doença holandesa. O longo período de valorização da moeda brasileira frente ao dólar apenas desestimulou os investimentos dos empresários locais.

O professor, entretanto, apresentou uma receita para reverter esse quadro, chamada por ele de “novo desenvolvimentismo”, focado na taxa de câmbio. Sua teoria propõe equilibrar os chamados “cinco preços macroeconômicos”, que são: a taxa de câmbio (o mais estratégico dos preços); a taxa de lucros, pois sem lucro não há investimentos e portanto não há desenvolvimento; a taxa de juros, que deve ser a mais baixa possível; a taxa de salários, que deve ser a mais alta possível e compatível com o investimento; e a taxa de inflação; que deve ser baixa.

Esses são os cinco preços macroeconômicos, e o mercado não equilibra esses preços de jeito nenhum, quer dizer, [portanto, que] o governo tem que administrar para que esses preços sejam equilibrados”, defendeu.

A ideia fundamental do Desenvolvimentismo Clássico nasceu na Europa, junto à ONU, no âmbito da crise de 1929, também conhecida como a crise do pensamento ortodoxo neoclássico. O grande sistematizador dessas ideias foi John Maynard Keynes, cujas obras afirmavam que um país, para se desenvolver, precisava primeiramente se industrializar e o papel do Estado era fundamental para induzir a industrialização e como planejador macroeconômico e investidor de infraestruturas.

As propostas do Desenvolvimentismo Clássico no Brasil foram emplacadas pelo ISEB (o Instituto Superior de Estudos Brasileiros), grupo formado nos anos 1950, que influenciou também o governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961) e que teve como cabeças o economista Inácio Rangel, o cientista político Helio Jaguaribe, o sociólogo Guerreiro Ramos e o filósofo Alvaro Vieira Pinto. “Conheci todos eles, que foram fundamentais na minha própria formação”, completou Bresser Pereira.

O professor lembrou que as políticas implantadas por Delfim Neto, então Ministro da Fazenda nos governos militares, foram fundamentais a industrialização e crescimento do país. “Ele [Delfim Neto] montou um sistema em 1967 de neutralização da doença holandesa, que nem era conhecida como doença, dando subsídios às exportações de manufaturados junto com a alta de tarifa de importação”. Segundo Bresser Pereira, com isso as exportações de manufaturados brasileiros, que em 1965 correspondiam a 6% da balança comercial, passaram para 66% em 1985. “Foi uma coisa extraordinária, ou seja, o modelo já não era mais de substituição de importações, e sim exportação de manufaturados que tínhamos na época”.

Durante a Ditadura Militar, Bresser Pereira foi autor de vários artigos criticando Delfim Neto. Hoje o professor explica que as suas críticas, até hoje defendidas, se davam em cima da excessiva concentração de renda causada pelas políticas econômicas da época, reconhecendo, por outro lado, os resultados positivos de Delfin Neto no fortalecimento das exportações de produtos beneficiados brasileiros.

Bresser Pereira explicou que existem duas causas para a permanente apreciação de câmbio em países em desenvolvimento. Ao contrário do que alguns imaginam, não decorrem de comportamentos do consumidor, mas sim de duas políticas. A primeira, de crescimento da poupança externa. “Quando você decide crescer com poupança externa, está decidindo que vai ter um déficit de conta corrente, e que esse déficit vai ser financiado por investimentos diretos, ou por financiamento externos. E foi isso o que Fernando Henrique fez”.

Outra política errada apontada pelo professor, realizada não apenas por Fernando Henrique, mas também por Lula e Dilma, é a de âncora cambial, ou seja, “a política de tentar segurar a inflação apreciando o câmbio”. O “grande equívoco” dos governos Lula foi a apreciação “violenta” da taxa de câmbio. “Ele [Lula] teve um grande mérito em fazer a distribuição de renda, especialmente através do aumento do salário mínimo, mas cometeu um erro brutal que foi deixar o câmbio em um nível alto”, ponderou.

E essa foi a herança “maldita” de Lula entregue à Dilma. O professor defendeu que hoje, a primeira coisa que o governo Dilma deveria fazer para reaquecer a economia é restabelecer, minimamente, o equilíbrio macroeconômico, reduzindo pela metade o déficit público, hoje em 5% do PIB. Ele também sugeriu a redução da taxa de juros básica (Selic), entendendo que o nível adequado deve ser de 1% a 2%.

Segundo Bresser Pereira, em termos econômicos, o governo de Dilma começou mal por ter recebido como herança um câmbio “escandalosamente apreciado”. A presidente teria sido corajosa, no início de governo, ao promover uma redução forte da taxa básica de juros, a Selic. “A taxa de juros real no Brasil foi a 2,5%, há anos não se via isso no país. Além disso, ela depreciou o câmbio em 20%, o que foi ótimo, mas não o suficiente”.

O erro cometido por Dilma, na visão do professor, foi ter deixado de fazer um ajuste fiscal nas contas públicas, junto com a depreciação do câmbio. Isso, por conta da pressão inflacionária, que ocorre automaticamente quando se deprecia o câmbio.

Nessa mesma fase, do primeiro mandato, a demanda por commodities começou a cair internacionalmente. A receita gerou o famoso “pibinho”, e o governo Dilma, sensível aos ataques da grande mídia, começou a recuar aumentando a taxa básica de juros e mantendo o câmbio.

Integra da entrevista com prof. Bresser Pereira: http://bit.ly/1D3pblK

Publicado no GGN

Lilian Milena.


Créditos de imagem: bit.ly/1D3pblK

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