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(Entrevista conduzida pela jornalista Deborah Relink com o Patrick Pouyanné, presidente do grupo francês Total)

O crescimento do Brasil está em queda e a Petrobras, sua parceira no pré-sal, está metida num escândalo de corrupção. Isso o preocupa?

Patrick Pouyanné – Acho que a Petrobras é suficientemente sólida para enfrentar essas dificuldades. Tem recursos importantes. Tenho certeza de que a Petrobras vai sair dessa. Na Total, temos altas exigências em governança. No que diz respeito à nossa relação com a Petrobras e a nossos associados no projeto Libra, queremos que a forma como o projeto é administrado esteja em conformidade com essa filosofia. Acho que a Petrobras é capaz de enfrentar esse tipo de debate, essa tempestade.

É mais do que um “debate”; é uma investigação de corrupção. E hoje a Petrobras vale um terço do que valia em 2010.

Esse é um assunto para os acionistas.

Mas a Total é parceira da Petrobras, que, além de enfrentar denúncias, está endividada.

Espere! A Petrobras é uma empresa nacional que tem imensos recursos de petróleo. O Estado do Brasil tem 60% do pré-sal.

Estou convencido que a Petrobras tem todos os recursos petrolíferos para poder enfrentar essa dificuldade financeira. Estou convencido de que o estado do Brasil não vai deixar a Petrobras quebrar.

A situação da Petrobras poderá ter uma influência numa questão: em que ritmo vamos desenvolver o projeto Libra? A Petrobras estava indo muito rápido. Nós, da Total, também queremos ir rápido, mas de uma forma que o desenvolvimento seja otimizado no plano de custos. Estou convencido de que vamos poder achar um bom plano de desenvolvimento de Libra que concilie as restrições da Petrobras e da Total.

O senhor prevê uma desaceleração do desenvolvimento de Libra?

Não, eu penso que vamos avançar. Mas a prioridade deve ser desenvolver o projeto da forma mais eficaz possível em relação aos custos. Queremos desenvolver, vamos discutir isso com a Petrobras e estou certo de que vamos encontrar um meio de avançar no ritmo adequado.

Nada disso o inquieta?

Faz parte dos imprevistos. No mundo do petróleo e do gás, temos muitos imprevistos. Veja, o preço do barril caiu de US$ 100 para US$ 50. Eu trabalhei em países como a Rússia, temos negócios no Brasil e em países explosivos, como Venezuela, Irã, Cazaquistão, Nigéria, Angola… Mas é por isso que a profissão de petrolíferas é emocionante. Não somos nós quem decidimos onde está o petróleo e o gás.

Na Total, o Brasil, a Rússia, a Nigéria, o Cazaquistão, nenhum desses países, individualmente, vai representar mais de 10% do capital da empresa. Eu administro US$ 100 bilhões em capital. Nossa força em relação aos outros é que eu posso me dedicar muito ao desenvolvimento (do grupo) no Brasil.

Mas, no final das contas, mesmo que eu ponha US$ 10 bilhões de investimento no Brasil, isso vai representar, no máximo, 10% do capital da Total. Isso nos permite assumir riscos em países como Nigéria e em todos estes países, porque é lá que tem petróleo. Neste meio muito capitalista do petróleo, essa é uma das principais forças: nossa capacidade de administrar o risco.

Quais os riscos mais importantes, políticos ou tecnológicos?

Hoje, o maior risco da indústria petrolífera, repito, é o custo. Gastamos muito dinheiro. Temos que ser capazes de reduzir custos.

E os maiores desafios?

Temos a volatilidade do preço do petróleo bruto, estamos numa indústria cíclica. Fazia um momento que o preço estava relativamente alto, agora baixou.

Total é um grupo absolutamente sólido, com pouca dívida. Estou confiante na capacidade de Total de resistir.

Diria mais: quando os preços estão em baixa, a indústria petrolífera está melhor preparada do que muitos de seus concorrentes para reagir, resistir e aproveitar.

É uma oportunidade. É uma ocasião para mim de passar uma mensagem forte à empresa e à indústria, assim como no caso do projeto Libra.

A mensagem é a de que é preciso aproveitar agora para gastar menos e reduzir custos, ser mais eficaz. Gastamos muito dinheiro porque tínhamos muito dinheiro com o barril do petróleo a US$ 100. Esquecemos um pouco dos fundamentos (econômicos). Risco faz parte da nossa profissão.

Além de redução de custo, que outra mensagem o sr. está passando à Petrobras neste momento?

A de que somos um parceiro de longo prazo. Fomos ao Brasil porque, primeiro, os países têm recursos importantes no pré-sal. Em toda essa discussão, há muitos elementos de curto prazo que você evocou. Mas acho que é preciso manter uma visão de parceria de médio e longo prazo. Isso é muito importante na nossa indústria.

E o baixo crescimento econômico do Brasil? Não o preocupa?

Não, o Brasil tem uma grande população. É um país que tem evidentemente um grande potencial.

Estamos com crescimento zero.

Neste momento, mas espere… O mundo inteiro hoje tem problema de crescimento e dificuldades por todos os lados do planeta ligados a problemas monetários e financeiros.

O que sei é que o Brasil tem o fundamental para o crescimento econômico, que é sua população. A população exige acesso ao bem-estar, ao desenvolvimento social, à energia elétrica e etc.

Acho que o Brasil pode oferecer aos investidores um potencial significativo. E é por isso que continua a ser um país que atrai.

A Total anunciou cortes drásticos de custos e investimentos. Isso vale para o Brasil?

Não reduzimos investimentos já previstos. Todos os novos grandes projetos, como Libra, foram preservados.

Decidimos no final de 2014 fazer um uma unidade de produção para realizar testes de longa duração com capacidade de produção de 50 mil barris por dia. Isso avança.

E as grandes decisões para lançar os novos projetos de desenvolvimento da Libra serão conhecidas no final de 2015 ou início de 2016. Estamos trabalhando nisso. Manteremos nossa estratégia de crescimento. E Libra faz parte de nosso desenvolvimento.

A queda no preço do petróleo não muda os planos?

Libra tem entre 6 e 12 bilhões de barris. Tem uma concessão de 35 anos e é tipicamente um exemplo de projeto onde não se deve reagir e mudar de ideia em função do preço do petróleo, porque teremos 35 anos pela frente. Sabemos que o preço do petróleo vai ser volátil, subir e descer.

Nosso grande interesse com o projeto Libra é que não é um projeto de curto prazo. É um projeto de produção de longo prazo que pode resistir a altos e baixos.

Exploração em águas profundas é difícil. De zero a dez, como avalia o risco no caso do projeto Libra?

A Total é uma das empresas líderes em exploração em águas profundas. E estamos em parceria com a Petrobras, que é um dos melhores na prospecção em águas profundas. De zero a dez, eu diria que o risco é 5, médio.

O mais importante é reduzir custos. Precisamos aproveitar o momento atual para isso, pois estamos na fase de design do projeto. É nessa fase que vamos tomar decisões para os próximos 20 a 30 anos.

No Brasil, às vezes os custos são um pouco elevados porque há proteção e exigência de conteúdo local, e isso custa caro. Temos que dar a instrução aos nossos engenheiros: desenhe um projeto que resista, seja sólido, mas com a prioridade: não seja caro.

Há planos de investir em outras áreas no Brasil?

Pretendemos investir em energia solar. Já desenvolvemos um grande projeto de energia solar no Chile, mas no Brasil é um pouco mais complicado. No mix energético de vocês há muitas hidroelétricas e biomassa a cana-de-açúcar, onde vocês já são muito inovadores. Mas a solar tem um potencial interessante. Esse é um dos caminhos que quero discutir com autoridades.

Vocês estão buscando parceiros no Brasil?

Sim, estamos buscando parceiros neste momento. Ainda não achamos e se tivesse achado, não lhe diria.

Publicado pelo jornal FSP (23/03/2014)


Créditos de imagem: arcinfo.ch

 

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