Em Conjuntura Internacional, Destaques

Na coluna de 11/07/14*, eu registrei a disposição demonstrada pela Quinta Geração de dirigentes chineses em não se deixar impressionar com as evidências de má vontade para com a China, da parte do novo Primeiro Ministro da Índia, o radical de direita Narendra Modi. Em maio de 2014, os chineses não foram convidados para a posse de Modi, numa cerimônia na qual brilhou, no entanto, o representante do governo tibetano no exílio. Modi escolheu o Japão para sua primeira viagem ao exterior (agosto 2014), num aparente aprofundamento do arco estratégico de contenção da China, sabidamente estimulado pelos EUA. Os dirigentes chineses relevaram tudo isso, preferindo explorar o grande interesse pela experiência econômica chinesa que Modi expressara, quando na chefia do governo da província de Gujarat. Nessa época, ele fez várias visitas “de estudo” à China, inclusive por conta própria. Um mês após sua instalação na chefia do governo federal, o Ministro do Exterior chinês, Wang Yi, foi visitá-lo, na condição de interlocutor das velhas passagens de Modi pela China. E semanas depois da visita ao Japão, foi o próprio Presidente chinês, Xi Jinping, que em meio a um circuito da Ásia do Sul, desceu na Índia a tempo de participar do jantar de aniversário de Modi, em Ahmedabad, a principal cidade de Gujarat.

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Narendra Modi e Barack Obama

The Economist publicou (23/05/15) um suplemento com as promessas e realizações de Modi, apresentando-o como “homem dos sete instrumentos”. A ideia era frisar sua propensão a conduzir sozinho o propósito de fazer deste o “século da Índia”. Ele continua, contudo, a apoiar-se em Amit Shah, que foi Secretário do Interior nos doze exitosos anos em que Modi governou a província de Gujarat, e que ele conseguiu agora colocar como presidente do BJP (Bharatiya Janata Party), após a estrondosa vitória nas eleições de 2014. Sob a dupla Modi-Shah, o BJP vem levantando vitórias eleitorais em varias províncias, martelando quase só a palavra de ordem vikas (desenvolvimento). Modi distingue 2022, quando se comemorarão 75 anos da independência da Índia, como o prazo para a confirmação da “chegada” do país, e o suplemento de The Economist concorda em ver o início dos anos 2020 como um ponto de inflexão demográfica de importância: a população indiana estará alcançando o nível de manutenção da fertilidade (2,3 filhos por casal). Esse equilíbrio virá graças a que os hindus do Sul e da costa ocidental estão se aproximando, social e economicamente, dos níveis do Sudeste Asiático, apesar de as províncias do Norte continuarem com um crescimento populacional desordenado. O suplemento fornece também uma lista dos alvos propostos por Modi para 2022, destacando-se: 100 milhões de novos empregos em manufaturas; construção de 100 “cidades inteligentes”; instalação de 100 milhões de sanitários; erradicação da tuberculose e do sarampo; edificação de 65 milhões de casas populares, com a eliminação de todas as favelas do país.

Narendra Modi oscila entre Washington e Pequim

Xi Jinping e Narendra Modi

Na busca desses alvos, Modi tende a usar, em parte pelo menos, lições aprendidas nas suas antigas viagens à China. Isto é formalmente reconhecido no tocante às “cidades inteligentes”. A primeira delas, Gift, está sendo levantada em área de 358 hectares, próximo a Ahmedabad, contando com a participação de uma firma chinesa. O circuito de Xi Jinping pela Ásia do Sul, em setembro de 2014, visava promover o projeto chinês da “Rota da Seda Marítima”, e esse foi o grande tema das conversas dele com Modi, em Ahmedabad. Na Índia como na China, os jornais encheram-se de prognósticos sobre um aumento de 250 vezes nos investimentos chineses na Índia, num clima de bom entendimento entre os dois líderes, que trataram de somenos incidentes militares ocorridos nas zonas fronteiriças em litígio. O mesmo bom entendimento perduraria na visita de retribuição de Modi à China (maio de 2015). Em vez de receber o visitante em Pequim, como de praxe, Xi o acolheu em Xian, cidade rica em monumentos e hoje a capital da província de Shaanxi, de onde Xi é natural.

Modi revela muito interesse pela política externa. No seu primeiro ano de governo gaba-se de ter conversado diretamente com 50 líderes estrangeiros. Analistas indianos falam de dois Modis: o primeiro cultiva com determinação laços econômicos com os países vizinhos; o segundo busca no Ocidente reforços para a segurança nacional. A este último respeito estabeleceu calorosas relações com os Primeiros Ministros do Japão e da Austrália, além de uma vistosa visita aos EUA, retribuída sem tardar pelo Presidente Obama, o principal hóspede nas celebrações do Dia da República (janeiro de 2015). Obama e Modi deram a público um comunicado comum de cooperação estratégica. Mas na outra dimensão avantaja-se a China. Além do trabalho pertinaz de Xi Jinping em torno da Rota da Seda, há a parceria no quadro dos BRICS. Participação no Novo Banco de Desenvolvimento, consolidado na VII Cúpula do grupo, em Ufá (julho de 2015). E as promessas do Banco Asiático de Investimentos em Infraestrutura (BAII). É dessa movimentação chinesa que sairão os fundos para o desenvolvimento da Índia.

* https://rogeriocerqueiraleite.com.br/2014/07/eua-china-a-mudanca-politica-na-india-e-a-china/


Imagem: 1- globalgujaratnews.com; 2-Harish Tyagi/European Pressphoto Agency ; 3- Larry Downing/REUTERS

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