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Por José Augusto Ribeiro

A notícia não chegou a ser registrada na mídia e foi deliberadamente suprimida do Jornal da Câmara, por ordem do ainda Presidente Eduardo Cunha, mas a Câmara dos Deputados rejeitou, com mais de 300 votos “não”, muito mais que a maioria absoluta de seus integrantes, o requerimento de urgência para o projeto do deputado Mendonça Filho que pretende acabar com o regime de partilha na exploração dos recursos do Pré Sal e retirar da Petrobrás o direito de ser operadora única nessa área que ela descobriu sozinha, com seus próprios recursos.

O requerimento de urgência foi posto em votação no dia 6 de outubro, num momento de confusão absoluta, na expectativa de que seria aprovado sem que se percebesse o que de fato era decidido. Mas os deputados foram alertados e mais de 300 deles votaram contra, derrotando o pedido de urgência. O projeto agora terá de passar pelo exame das comissões e só depois disso voltará ao plenário, para ser definitivamente rejeitado ou, infelizmente, aprovado.

É de supor que esses mais de 300 que rejeitaram a urgência rejeitem igualmente o projeto, mas nunca se sabe como será o dia de amanhã. De qualquer maneira, a rejeição da urgência pode e deve ser o início de uma espécie de mobilização permanente em defesa da Petrobrás, que enfrenta desde sua criação, há mais de sessenta anos tentativas incessantes de acabar com ela, ou direta ou obliquamente.

O golpe até hoje mais eficaz contra a Petrobrás foi, na década de 1990, no governo Fernando Henrique, a combinação da emenda constitucional e da legislação infraconstitucional por ela permitida que, a pretexto de flexibilizar o monopólio estatal do petróleo, na verdade acabaram com ele e promoveram a concessão de áreas muito promissoras, nas quais a Petrobrás fora pioneira, a grupos privados multinacionais (e até brasileiros) sem qualquer compromisso com o desenvolvimento e o futuro do país.

Com a descoberta do Pré-Sal, em 2006, essa legislação entreguista foi substituída, apenas na área do Pré Sal, pelo regime de partilha, melhor que o das concessões mas ainda distante do regime original do monopólio. Exercendo o papel de operadora exclusiva, a Petrobrás pode impedir a exploração predatória dos recursos do Pré Sal, que não é do interesse do Brasil, mas é não só de interesse como de urgência para países como os Estados Unidos, cada vez mais dependentes de petróleo importado.

A adoção do regime de partilha no Pré-Sal foi uma primeira vitória desde a grande derrota da década de 1990, mas estava ameaçada pelo escândalo da Operação Lava Jato. Hoje ninguém pode negar a ocorrência e a extensão da roubalheira na Petrobrás, que serviu maravilhosamente aos interesses antinacionais empenhados em promover a entrega das riquezas que a Petrobrás descobriu. Daqui para a frente, a direção da Petrobrás tem o dever de pensar mais no Brasil que no mercado, essa entidade caprichosa que o pensamento único de nossos dias adora como se fosse o bezerro de ouro dos dias bíblicos.

 E a Câmara não pode recuar da posição assumida pelos mais de 300 votos que rejeitaram a urgência para o projeto Mendonça Filho, sobretudo se o Senado aprovar o projeto semelhante do senador José Serra – porque a decisão do Senado terá de contar com a aprovação da Câmara. Aliás, bem que o Senado poderia mirar-se no exemplo da Câmara e rejeitar o projeto Serra.

Se isso, desgraçadamente, não acontecer, e se, ainda mais desgraçadamente, um dos dois projetos for aprovado nas duas casas do Congresso, ainda haverá o recurso do veto presidencial. A Presidente Dilma, nesse caso, terá o dever de vetar, coerente com a decisão do ex-Presidente Lula de adotar para o Pré Sal o modelo da partilha em vez daquele das concessões, que é o modelo pusilânime da submissão. 

AEPET: 13/10/2015.

José Augusto Ribeiro. Jornalista e Escritor.


Imagem: Bira

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