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Por Marcio Pochmann

Sinais de polarização política crescem de dimensão no quotidiano da sociedade brasileira. Estranho notar, contudo, elementos consistentes de justificativa da polarização se o foco for o comportamento de variáveis sínteses sobre a evolução da situação socioeconômica do conjunto da população.

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Desde o estabelecimento da estabilidade monetária, alcançada com o Plano Real no governo de Itamar Franco, em 1994, que o Brasil registra dois períodos distintos, em termos de polarização e acomodação no interior da sociedade.

O primeiro período pode ser definido como ganha-perde, conferido entre os anos de 1995 e 2003, uma vez que poucos segmentos sociais melhoravam, enquanto a maior parte perdia. No Gráfico 1, por exemplo, constata-se que a estabilidade no poder aquisitivo dos rendimentos ocorreu somente entre 1995 e 1997, para depois seguir decrescente até 2003, ao passo que o desemprego nacional aumentou continuamente até o ano de 1999, para depois estabilizar até 2003.

Gráfico 01: Brasil: evolução do índice do rendimento médio real dos ocupados com renda e da taxa nacional de desemprego (1995 = 100)

Do ganha-perde ao ganho-ganha

O segundo período denominado de ganho-ganha ocorrido a partir de 2004, registrou melhora simultânea em praticamente todos os segmentos sociais. O sentido geral do decréscimo no desemprego nacional e da elevação do poder aquisitivo no rendimento médio dos ocupados confirma a melhora generalizada das condições de vida do conjunto da população.

Em virtude disso, a polarização socioeconômica mais acentuada seria produto do final do século 20, enquanto a acomodação no interior da sociedade seria possibilitada no início do século 21. Ao se considerar o Gráfico 2, observa-se que a percepção do período do ganha-perde parece inegável entre 1995 e 2003, sobretudo quando separa-se o conjunto da sociedade em três segmentos distintos (ricos, intermediários e pobres) segundo o nível de renda.

No período do ganha-perde, somente os 50% da população mais pobre conseguiram ter o rendimento mantido acima da inflação, com elevação média anual de 0,2%. Nos mesmos anos de 1995-2002, o segmento de rendimento intermediário dos brasileiros (do sexto a oitavo décil da escala da distribuição pessoal da renda) registrou perdas médias anuais de 0,4%, enquanto os 20% mais ricos acusaram queda mais acentuada (1,2%) na renda.

Gráfico 02: Brasil: variação média anual do rendimento real dos ocupados com renda de todos os trabalhos (em %)

Do ganha-perde ao ganho-ganha

Na fase atual do ganho-ganha, pelo menos até o ano de 2013, segundo informações oficiais do IBGE, todos os segmentos sociais elevaram significativamente o nível de rendimento. Os 50% mais pobres da população aumentaram a cada ano, em média, 5,8% o poder aquisitivo do rendimento, ao passo que o segmento social intermediário cresceu a renda média em 5,2% ao ano e os ricos subiram 4,1% como media anual entre 2003-2013.

Neste sentido que o período recente do ganho-ganha evidencia a acomodação socioeconômica, não a polarização, uma vez que ninguém ficou para trás. Talvez, a simbologia do trânsito em que todos estariam em movimento na via, parece indicar certo desconforto político, uma vez que o pessoal do transporte coletivo estaria andando mais rapidamente, enquanto aqueles do transporte particular e individual e até de luxo mover-se-iam com velocidade menos intensa.

Seria isso um bom motivo para justificar sinais de polarização política?

Desde o Plano Real do governo de Itamar Franco, em 1994, que o Brasil registra dois períodos distintos, em termos de polarização e acomodação no interior da sociedade: a) período ganha-perde (1995-2003) sob o governo tucano; b) período ganha-ganha (2004-2015) sob o governo petista.

Publicado no Carta Maior (12/03/2015)

Marcio Pochmann. Economista.


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