Em Destaques, Vida Nacional

Por Rodrigo Gomes

O juiz Alex Costa de Oliveira, da Vara da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), autorizou o uso de técnicas de tortura para “restrição à habitabilidade” das escolas, com objetivo de convencer os estudantes a desocupar os locais. Entre as técnicas estão cortes do fornecimento de água, luz e gás das unidades de ensino; restrição ao acesso de familiares e amigos, inclusive que estejam levando alimentos aos estudantes; e até uso de “instrumentos sonoros contínuos, direcionados ao local da ocupação, para impedir o período de sono” dos adolescentes.

O juiz ainda ressalta que tais medidas ficam mantidas, “independentemente da presença de menores no local”. “Autorizo expressamente que a Polícia Militar (PM) utilize meio de restrição à habitabilidade do imóvel, tal como, suspenda o corte do fornecimento de água; energia e gás (…) restrinja o acesso de terceiro, em especial parentes e conhecidos dos ocupantes (sic)”.

O magistrado pede ainda a identificação de todos os ocupantes e que a PM observe uma eventual prática de corrupção de menores no local. A determinação é paralela à determinação de reintegração de posse imediata das escolas, emitida no dia 28, demandando apenas que a polícia efetive o reconhecimento dos locais, conheça o número de ocupantes e disponibilize efetivo para a ação.

Para o advogado Renan Quinalha, que auxiliou os trabalhos da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo, a decisão é absurda e legitima técnicas de tortura contra estudantes nas escolas ocupadas. “É uma reedição de técnicas de tortura. São considerados meios mais amenos, por assim dizer, por que não tem violência direta, mas isso agride física e mentalmente os estudantes. Visa criar o caos entre os jovens. Não é para convencer. É autoritário e violento”.

Na madrugada de 1º/11, um grupo invadiu ilegalmente o Centro de Ensino Médio Ave Branca (Cemab), em Taguatinga, cidade-satélite de Brasília e lançou bombas caseiras e coquetéis molotov para expulsar os alunos que ocupavam o local. Pela manhã oficiais de justiça, acompanhados por soldados da Polícia Militar do Distrito Federal, cumpriram mandado de desocupação da escola. Os alunos saíram pacificamente do local.

O Distrito Federal tem outras sete escolas ocupadas nas cidades-satélites de Samambaia, Planaltina, Recanto das Emas, Taguatinga e em Brasília, no Plano Piloto. Também estão ocupados cinco institutos técnicos federais, localizados nas cidades-satélites de São Sebastião, Planaltina, Riacho Fundo, Estrutural e Samambaia. Na noite de ontem, estudantes da Universidade de Brasília (UnB) decidiram ocupar a reitoria.

Em todo o país, mais de mil escolas foram ocupadas em protesto contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241 (que se tornou PEC 55 na tramitação atual, no Senado), que vai causar cortes de verbas nas áreas sociais, da saúde e da educação, e contra a Medida Provisória 746, que propõe a reforma do ensino médio sem discussão com especialistas, profissionais e estudantes.

Veja abaixo um trecho da decisão:

 1  2

***

O isolamento físico e privação de sono estão entre técnicas de tortura autorizadas pela agência de inteligência (CIA) para combater o terrorismo após setembro de 2011. Como explica o colunista e Procurador do Estado, Márcio Sotelo Felippe – “uso de sons para infligir sofrimento a uma pessoa, privando-a do sono, é conhecida e antiga técnica de tortura”.

Ao blog Justificando, Gorete Marques, Doutora pela Universidade de São Paulo (USP), integrante do Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura e do Núcleo de Estudos de Violência (NEV-USP), afirmou que a decisão legitima a tortura e explica o proquê:

Uma das definições da tortura é submeter alguém a intenso sofrimento físico e mental. Todo o tipo de restrição, seja do sono, de alimentos ou de água podem causar os mais diversos danos ao individuo. Discute-se muito a “tortura ligth”, utilizada por soldados americanos, que se baseia em formas de gerar sofrimento com utilização de sons, iluminação, restrição de alimentos e do sono. Especialistas alertam para os danos que tais práticas causam ao organismo, sobretudo quanto ao aspecto emocional e psicológico.

Para Gorete, decisões como essa devem nos fazer questionar em que Estado nos encontramos: “Quando a tortura é autorizada e oferecida como estratégia por juízes, que deveriam zelar pelas garantias de direitos fundamentais, precisamos nos perguntar em que Estado nos encontramos. Sobretudo quando tais atos são direcionados contra adolescentes”.

Além disso, o magistrado reforçou que os métodos devem prevalecer, sobretudo, na presença de crianças e adolescentes.

Leia sobre o mesmo tema:

CartaCapital/Intervozes: A cobertura midiática das escolas ocupadas: silêncio e criminalização. Marina  Pita (Jornalista) – http://bit.ly/2eBi27I

Blog Justificando: Tortura sonora é tortura sim e não pode ser relativizada. Samuel Sganzerla
(Advogado
) – http://bit.ly/2enucDN                                                                                              Blog Motherboard: Entenda como a tortura sonora machuca. Brian Andersonhttp://bit.ly/2eePdx7

Blog Justificando [http://justificando.com/]:01 /11/2016.

RBA [http://www.redebrasilatual.com.br/]:02/11/2016.

_______________

Rodrigo Gomes. Jornalista.

 

Facebooktwitter