Em Destaques, Sem papas na língua

Benjamin Disraeli, judeu de origem italiana que foi primeiro-ministro da Inglaterra vitoriana duas vezes (em 1868 e de 1874 a 1880), dizia: “Nunca explique, nunca reclame” (“Never explain, never complain”).

É uma atitude bem inglesa. Dignidade, diriam uns; empáfia, diriam outros. A atitude parece ter sido adotada pela onipotente Petrobras até estourar a bomba da refinaria de Pasadena, no Texas (Estados Unidos).

O escândalo se baseara principalmente na discrepância entre o preço que a Astra, proprietária antecessora à Petrobras, pagara, o que seria US$ 42,5 milhões e aquele que a Petrobras havia pago por 50% da empresa, US$ 359 milhões, o que pressupunha um valor de US$ 718 milhões, ou seja, uma soma 17 vezes maior do que a paga pela Astra.

Após quase um mês de confusões, a presidente da Petrobras, Graça Foster, explica que o valor pago pela Astra foi de US$ 248 milhões, que somados a investimentos alcançariam US$ 390 milhões. Com isso, o que pagou a Petrobras à Astra pela refinaria seria apenas 80% a mais.

Essa discrepância é facilmente explicável pelas flutuações do mercado de petróleo, à época exacerbadas. Basta dizer que no momento da compra da refinaria pela Astra, a margem no refino chegou a cair a US$ 2/barril, enquanto quando da compra pela Petrobras teria a margem atingido US$ 12/barril. O que explica quase tudo, só não explica a delonga da Petrobras em dar estas explicações. Aliás, que não foram dadas à opinião pública, mas ao Congresso Nacional e, assim mesmo, sob pressão.

É hora de perguntarmos a quem serve essa demora. Seu prestígio e o do governo sendo enxovalhados, e a Petrobras apanhando conformada. É inverossímil a hipótese de que ninguém da corporação soubesse os verdadeiros valores. E quem teria fornecido à imprensa o valor de US$ 42,5 milhões? Se o ato foi de má-fé, por que não abre a Petrobras uma sindicância?

A presidente Foster disse que não precisamos nos preocupar. As reservas brasileiras de petróleo seriam suficientes para 20 anos. Esta afirmativa não tem sentido. A curva de produção de petróleo, seja de um poço, seja de um campo, seja de uma região ou país, cresce inicialmente, atinge um pico e depois cai.

É possível que tivesse, entretanto, a presidente usado um parâmetro tradicional do setor: tempo de duração da reserva, que é igual ao volume da reserva dividido pela produção. Neste caso, deduzimos que o total da reserva é de 15 bilhões de barris, o que confere com o que afirmou a presidente Dilma Rousseff há dois anos, tal seja, que o pré-sal teria 8 bilhões e o remanescente convencional (incluindo águas profundas) 7 bilhões de barris.

Todavia, as reservas tradicionais deviam estar se extinguindo rapidamente, pois esta é a única explicação para o fato de que a produção permaneceu constante nestes três últimos anos, enquanto a contribuição do pré-sal cresceu de zero a 400 mil barris/dia. O que faz então a Petrobras pensar que pode vir a produzir 4 milhões de barris por dia?

Talvez se a Petrobras se acostumar a dar explicações ao público, seu prestígio possa ser recuperado.

 

Créditos de imagem: adesg.net.br

*Artigo publicado no jornal Folha de São Paulo de 29/04/2014.

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