Em Conjuntura Internacional, Destaques

Dentre os triunfos de Barack Obama no plano internacional, um que está agora sob o fogo de Donald Trump é o acordo nuclear com o Irã. Negociado durante dezoito meses, entre Teerã e uma coligação ocidental (os cinco membros permanentes do CSNU mais a Alemanha), o acordo fora impulsionado o tempo todo por entendimentos secretos entre americanos e iranianos. Foi assinado em Viena, a 14 de julho de 1915, e ratificado sete dias mais tarde, por unanimidade, pelo CSNU. Em que pesasse tudo isso, Donald Trump, fez críticas e ameaças ao acordo durante sua campanha presidencial, e   no dia 3 de fevereiro de 2017, já empossado Presidente, Trump impôs unilateralmente   uma série de sanções ao Irã, pretendendo impedir que os cidadãos de 13 países, entre os quais Irã, China, Emirados Árabes Unidos e Líbano, além de 12 grandes corporações, realizem qualquer tipo de negócio no território americano ou com cidadãos americanos. O Irã não perdeu tempo para responder ao que chamou “sanções humilhantes”, e logo no dia 4 iniciou exercícios militares incluindo o lançamento de mísseis. Utilizando uma rede social, Trump postou seu comentário: “O Irã está brincando com fogo. Eles não entendem quão gentil Obama foi com eles. Eu não o serei.”

País de história milenar, herdeiro do poderoso Império Persa da era pré-Cristã, o Irã, chamado antes Pérsia, islamizou-se na expansão inicial do Maometismo. Só que as circunstâncias locais fizeram com que adotasse o xiismo, numa escolha da linha sucessória de Maomé. O mundo árabe em torno tendeu a adotar o sunismo. Essa divergência marca hoje o relacionamento entre os países da região do Golfo Pérsico, notadamente na rivalidade entre o Irã e a Arábia Saudita pela liderança regional. Essa rivalidade é grande, também, no tocante ao petróleo e no seio da OPEP, posto que os dois países em causa estão entre os maiores produtores do ouro negro e entre os maiores detentores de reservas de hidrocarbonetos. Não terei espaço para descrever a história política do Irã e sua participação na economia mundial do petróleo, após a liberação do país do velho Império otomano, desmembrado na I Guerra Mundial. Houve um período de restauração da monarquia, no qual o Irã esteve estreitamente ligado aos EUA, que inclusive introduziram no país o interesse pela indústria nuclear. A experiência monárquica foi superada por uma revolução conduzida pela cúpula religiosa, há 38 anos em conflito com os EUA. Reduzido a uma situação de pária da comunidade internacional pelas sanções do Ocidente, o regime iraniano dos aiatolás soube no entanto resistir às pressões que buscavam suprimi-lo. Parte importante dessa resistência foram os avanços no programa nuclear, que já deram ao Irã uma boa margem de independência na construção da bomba atômica. O acordo obtido por Obama congela aspectos desse programa, em troca do reingresso do país no jogo mundial do petróleo. Em Teerã, isso é visto ademais como liberação das pressões americanas Cinco dias depois da assinatura do Acordo de Viena, o líder supremo aiatolá Ali Khamenei proclamou na TV iraniana: “Não temos qualquer outro compromisso com os EUA. O Irã não modificará suas alianças na região, sejam ou não do agrado dos EUA ou de Israel.”. É contra esse pano de fundo que vai se desdobrar a confrontação do Irã com Trump.

De maneira totalmente diferente desenvolvem-se as relações do Irã com a China. Em janeiro de 2016, o Presidente chinês e Secretário Geral do PCC, Xi Jinping, fez uma visita de trabalho a três países do Oriente Próximo: Egito, Arábia Saudita e Irã, tendo como objetivo principal a promoção do seu programa do peito, a Nova Rota da Seda. Na passagem por Teerã, no entanto, os três líderes que receberam Xi (o Líder Supremo        Ayatolah Ali Khamenei; o Chefe do Parlamento, Ali Larijani; e o Presidente do país, Hassan Rouhani  foram enfáticos em agradecer o “apoio decisivo” que a China teria dado, na sua posição de membro permanente do CSNU, para a boa conclusão do acordo nuclear. A expectativa, e neste sentido foram as promessas trocadas nos três encontros, era a de uma continuada cooperação chinesa com o programa nuclear iraniano. Observação que por sinal torna oportuno um levantamento de como está evoluindo, nos últimos dois ou três anos, a indústria nuclear da própria China. Na altura de 2014, tornou-se possível dizer que após um recuo de 25 anos as potencias do mundo estavam voltando a investir nos seus arsenais nucleares. A 7 de março de 2015, The Economist escreveu: “A China parece destinada a desafiar os EUA por supremacia em amplas áreas da Ásia; seus gastos militares estão crescendo em 10% ou mais por ano, na busca pela capacidade de um ‘segundo golpe’.” Cabe registrar que nos últimos meses o líder chinês Xi  Jinping defendeu, em diversos fóruns, a supressão global das armas nucleares. O governo da Quinta Geração está, na verdads, empenhado na expansão maciça da indústria nuclear para fins pacíficos, como não deixou de publicar The Economist  (24.09.16). No momento, a China dispõe de 36 reatores em operação e outros 20 em construção. A expectativa é que, em 2030, possa o país estar obtendo 9% da sua energia do nuclear (eram 2% em 2012).  A China está também se esforçando para firmar-se como exportadora de usinas nucleares. Consta, por exemplo, que há quatro exportações em marcha para países africanos, com destaque para o Sudão.

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Amaury Porto de Oliveira. Embaixador.

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