Em Conjuntura Internacional, Destaques

Por Luciana Lima

Informações sobre o embargo dos EUA contra Cuba

Em outubro de 1960, na sequencia da vitória da Revolução Cubana que derrubou o ditador Fulgêncio Batista, o presidente John F. Kennedy decretou embargo comercial, econômico e financeiro contra Cuba. Posteriormente medidas ainda mais severas visando o estrangulamento da Ilha foram adotadas, primeiro sob o governo de George H. W. Bush, com o Cuban Democracy Act (1992), em seguida durante os governos de Bill Clinton, o Helms-Burton Act (1996) e a lei proibindo as filiais estrangeiras de companhias norte-americanas de transacionar com Cuba produtos e serviços que ultrapassem o valor de US$700 milhões anuais (1999). O bloqueio unilateral que já dura mais de meio século causou até o momento danos econômicos para Cuba da ordem de 1 trilhão de dólares. Não obstante o isolamento a que vem sendo submetida Cuba, com os prejuízos e graves transtornos decorrentes, para o país e sua população, o bloqueio mostrou-se reconhecidamente ineficaz, à medida que não produziu o resultado pretendido pelo governo dos EUA, ou seja, a mudança do regime cubano. Por outro lado, o embargo só fez crescer nos últimos 23 anos a solidariedade internacional com Cuba, traduzida na sistemática condenação pela Assembleia Geral da ONU, através do voto da esmagadora maioria dos estados-membros (acima de 98% de aprovação), exigindo o fim da sanção arbitrária e a normalização das relações bilaterais em conformidade com direito internacional. Vale lembrar pesquisa realizada em fevereiro deste ano pela empresa Atlantic Council revelando que cerca de 60% dos norte-americanos defendem a normalização das relações do seu país com Cuba. Nesse sentido, o anuncio simultâneo no dia 17/12 pelos presidentes Barack Obama (EUA) e Raul Castro (Cuba) da intenção de normalizar as relações entre seus dois países é um acontecimento histórico e se reveste de importante significado simbólico, independentemente dos resultados práticos que venha a produzir – posto que a palavra final deverá ser dada pelo Congresso dos EUA.

 

iG – Que análise o senhor faz da decisão do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, de reatar relações do país com Cuba?

Samuel Pinheiro Guimarães – Eu acho que estamos vivendo um momento muito importante. Há 52 anos, os Estados Unidos não só decretaram um embargo unilateral em relação a Cuba, como também convenceram muitos países a imitar este embargo. Isso gerou um isolamento muito grande de Cuba e configurou uma clara agressão aos princípios de autodeterminação e de não intervenção que são os princípios básicos do sistema internacional. Agora o presidente Obama dá o primeiro passo para encerrar esta questão, com o reatamento das relações diplomáticas, com afrouxamento de uma série de medidas prejudiciais a Cuba, o anúncio da abertura de embaixadas.

Em relação ao foi do embargo econômico, Obama ainda dependerá do Congresso norte-americano, onde não tem mais maioria. Isso compromete a abrangência de sua decisão?

Foi uma decisão forte, abrangente, na medida em que ele fez o que estava ao alcance do Executivo. Realmente, o fim do embargo depende da aprovação do Congresso. Mas houve uma série de medidas e sua posição não é nada tímida.

Recentemente, as eleições no Brasil trouxeram discussões acirradas sobre a política externa dos governos petistas, bastante próxima de Cuba. Que influência o novo posicionamento de Obama pode ter em relação a esta questão no Brasil?

Eu acho que todo este episódio também veio mostrar que o ex-presidente Lula, quando tomou sua decisão de apoiar Cuba, não só no Porto de Mariel, mas muito antes, e a presidente Dilma, com o programa Mais Médicos, tomaram decisões muito acertadas. Os dois foram muito criticados pela oposição no Brasil, como sendo apoio ao regime comunista e assim por diante. O Brasil já havia patrocinado a participação de Cuba nos organismos das Américas, mesmo antes da Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos), na Cúpula Ibero-americana. De modo que o Brasil teve uma posição avançada. A decisão de Obama calou a oposição no Brasil. A oposição nem pode deixar de estar calada, até porque, para criticar, teria que atacar os Estados Unidos, o que para eles seria muito confortável. Eles não se sentem muito confortáveis nesta posição, atacou.

Que contexto o senhor observa na decisão de Obama, já que ele, somente agora, em seu segundo mandato e com minoria no parlamento, tomou tal decisão?

Sempre houve pressão interna e externa muito grande pelo fim do embargo. Internamente, existe a comunidade de cubanos que moram nos Estados Unidos que ganharam uma importância política muito grande. Além disso, sempre houve uma pressão para melhorar as relações dos Estados Unidos com os países da América Latina, não só com Cuba, mas praticamente com todos os países do continente. Todos esses países têm relações diplomáticas com Cuba e todos sempre pressionaram muito pelo fim do embargo. O embargo é condenado até hoje na Assembleia Geral das Nações Unidas, todos os anos. Esta decisão favorece a imagem dos Estados Unidos no mundo, e em especial, perante a América Latina.

O senhor considera que a motivação desta decisão é mais política ou econômica?

Mais política. Cuba é um país que tem 11 milhões de habitantes aproximadamente. Não é, portanto, um grande mercado. É claro que haverá um aumento do turismo de Cuba para os Estados Unidos e vice-versa, mas os Estados Unidos tem 350 milhões de habitantes o que deverá gerar um fluxo de turistas para Cuba muito maior do que o contrário.

O que o Brasil tem a ganhar com esta decisão?

O Brasil foi muito criticado por ter financiado a construção do Porto de Mariel, um porto que não é do Brasil, é um porto cubano, mas há pelo menos cerca 15 empresas brasileiras que já estão se instalando na área industrial em volta do porto. Não tenho todos os detalhes, mas trata-se de uma zona especial como as que foram criadas China. Nós exportamos principalmente para o mercado norte-americano, de modo que esta decisão foi muito acertada.

Luciana Lima. Jornalista. Conduziu a entrevista pelo iG.


Créditos de imagem: professorrafaelporcari.co

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